quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Análise do Discurso

O DISCURSO E O INTERDISCURSO


            O discurso é de natureza tridimensional. Sua produção acontece na história, por meio da linguagem que é uma das instâncias pó onde a ideologia  se materializa. Por isso, os estudos linguísticos tradicionais não conseguem abarcar a inteireza de sua complexidade.
            Como o discurso encontra-se na exterioridade, no seio da vida social, o analista/estudioso necessita romper ad estruturas lingüísticas para chegar a ele. É preciso sair do especificamente lingüístico, dirigir-se a outros espaços, para procurar descobrir, descortinar, o que está entre a língua e a fala (FERNANDES, 2005, p. 24).
Para a Análise do Discurso, o discurso é uma prática, uma ação do sujeito sobre o mundo. Por isso, sua aparição deve ser contextualizada como um acontecimento, pois funda uma interpretação e constrói uma vontade de verdade. Quando pronunciamos um discurso agimos sobre o mundo, marcamos uma posição – ora selecionamos sentidos, ora excluindo-os no processo interlocutório.
            Para Maingueneau, o discurso é “uma dispersão de textos cujo modo de inscrição histórica permite definir como um espaço de regularidades enunciativas” (2005, p. 15). Já Foucault dez “Chamaremos discurso um conjunto de enunciados na medida em que se apóia a mesma formação discursiva... ele é constituído de um número limitado de enunciados para os quais podemos definir um conjunto de condições de existência” (2005).

Os sujeitos falam de um lugar social
            Este lugar no discurso é governado por regras anônimas que definem o que se pode e deve ser dito. Somente nesse lugar constituinte o discurso vai ter um dado efeito de sentido. Se for pronunciado em outra situação que remeta a outras condições de produção,  seu sentido consequentemente, será outro.
            Na medida em que retiramos de um discurso fragmentos e inserimos em outro discurso, fazemos uma transposição de suas condições de produção. Mudadas as condições de produção, a significação desses fragmentos ganha uma nova configuração semântica (BRANDÃO, 1993).
            A unidade do discurso é um efeito de sentido, como Orlandi explica, “a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento” (1999, p. 15). Os discursos se movem em direção a outros. Nunca está só, sempre atravessado por vozes que o antecederam e que mantêm com ele constante duelo, ora o legitimando, ora o confrontando. A formação de um discurso está baseada nesse principio constitutivo – o dialogismo. Os discursos vêm ao mundo povoado por outros discursos, com os quais dialogam. Esses discursos podem estar dispersos pelo tempo e pelo espaço, mas se unem por que são atravessados por uma mesma regra de aparição: uma mesma escolha temática, mesmos conceitos, objetos, modalidades ou um acontecimento. Por isso que o discurso é uma unidade na dispersão


A transladação do corpo
Eu amava o amor
e esperava-o sob árvores, 
virgem entre lírios. Não prevariquei.
Hoje percebo em que fogueira equívoca
padeci meus tormentos.
A mesma em que padeceram 
as mulheres duras que me precederam. 

Adélia Prado em O Pelicano

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Análise do Discurso

Por meio do método Soler,  JOHNSTONE, analisou as estruturas narrativas de trinta histórias  de seus entrevistados, e percebeu que homens e mulheres não se diferem quanto ao tema narrado, pois ambos falam de algum tipo de violência, e suas narrativas tem o mesmo nível de propriedades. Ele explica que as narrativas dos homens são mais curtas, com menos riqueza de detalhes especificando apenas nomes de pessoas e lugares, e que são voltadas a atividades na rua. Para os homens, as outras pessoas são como instrumento para algum fim. No entanto, as mulheres narram histórias ocorridas em suas casa ou próximas a ela. Suas narrativas são mais detalhistas, narrando características do tempo, lugar e das pessoas, chegando a ser o dobro de uma narrativa masculina. As mulheres afirmam que as outras pessoas são como objetos a serem moldados e preenchidos com amor.
            HOLMES observou que as histórias de homens e mulheres da Nova Zelândia homens e mulheres refletem suas experiências diárias, as mulheres na família e nos filhos e os homens em esportes, e trabalho.
            Devemos ressaltar que para analisar as propriedades da narrativa, temos que postular modelos mentais mais complexos para todos os participantes. Esses modelos precisariam mostrar que as mulheres nessas interações interpretam diferentes papéis sociais, e que os modelos controlam as narrativas apropriadas de acordo com os participantes, o ambiente e ocasião.
            MACAULY mostra que a classe social interfere nas experiências narradas, ao ponto que mulheres de classe média narram sobre passeio e visitas, mulheres de classe baixa narram dias de trabalho, família. Os homens de classe média narram sobre esportes e trabalho, e os homens da classe operária narram as mudanças ocorridas no mundo. 
            Apesar de as narrativas de histórias refletirem, parcialmente, as experiências baseadas na classe e marcadas pelo genêro social, vemos que isso não explica a variação, pois há mulheres que trabalham, mas não falam de sua ocupação, e que as mulheres tendem a falar de seus filhos e da família, mais que os homens. Isso mostra que as narrativas não dependem apenas  do gênero e da classe social , mas de interesses individuais de cada narrador.
            KISPER observou histórias de professores, de uma sala de professores do EUA, e percebeu  que as mulheres contam histórias sem relação com o trabalho ao contrário dos homens. Nesse contexto, percebemos que não só há diferenças das narrativas pelo gênero, mas que também as pessoas tendem a conversar com outras do mesmo gênero por acreditarem que vão falar de assuntos de interesse mútuo.
            MACAULY descobriu, com o estudos de narradores da Escócia, que os  de classe baixa tendem a usar um número maior de marcadores de discurso e  de realce, ao passo que as pessoas de classe média usam mais expressões de avaliação.
            SOLER e MACAULY descobriu que as mulheres falam mais , contam mais histórias incluindo diálogos ,  e  falam a respeito de outras mulheres. Os   homens falam menos, sem exemplos de diálogos e a respeito de si mesmo.
            Esse livro trata de identidades nas histórias e na narração. A abordagem teórica dominante do livro é a concepção construtivista da identidade. Isto é identidade definida como construção contextual ou representação: as pessoas se posicionam de maneiras específicas por meio de seu discurso.  As histórias expressam constroem ou interpretam de muitas maneiras as identidades sociais dos narradores, receptores ou protagonistas. Durante as conversas, participantes trazem à  tona coisas ligadas a suas identidades pessoais e profissionais complexas.
Atos da fala
Em seu livro van Dijk cita Searle (1969, p. 278), que afirma que as “definições das condições de adequação dos atos de fala precisam ser formulados em termos de categorias contextuais  tais como os conhecimentos, os desejos ou propósitos dos participantes.” Para o autor o poder e as relações de papéis entre os participantes influenciam as interações entre eles e portanto seus atos de fala.
            Segundo Holmes (2005, p. 35-60) citado por van Dijk os gerentes usam o poder de sua posição  dando  instruções a seus empregados com o objetivo de obrigá-los a fazer coisas.  Isso significa que as posições sociais e as relações  hierárquicas estão entra as condições apropriadas dos atos de fala diretivos.
            Para van Dijk, no entanto, nas interações reais as situações são mais complexas, uma vez que os participantes precisam construir essas posições sociais em seus modelos de contextos. Assim um gerente que não se achar em uma posição social superior, irá primeiramente fazer pedidos aos seus subordinados. Além disso, outras características situacionais podem estar envolvidas como o ambiente,  as regras, as normas da organização   e outras relações existentes entre os participantes, umas vez que os participantes podem ser amigos ou estarem em uma comemoração informal na empresa o que  leva os atos de fala bruscos serem os menos adequados. Nesses ambientes, conforme esclarecem  ROJO  e ESTEBAN (2005, p. 82) as mulheres se sentem deslocadas devido ao” humor informal dos homens”.
            Holmes (2005) citado por van Dijk mostra que em Nova Zelândia o poder nos escritórios é exercido  por situações compartilhadas pelos participantes, e não a posição formal ou o poder que controla o uso da língua.
            O autor cita KYRATIZ e GUO (1996, p.555-557) em seu estudo, em que eles comparam diferenças de gêneros  nos EUA e na China. Segundo esses autores o controle dos atos da fala e da interação pela fala não depende apenas do gênero, mas também do ambiente e outros parâmetros situacionais como as diferenças culturais existentes nesses dois países.
            O estudioso esclarece que  da mesma forma que qualquer outra ação, os atos da fala são realizados sob o controle de fatores contextuais cognitivos ,como os propósitos ou  objetivos, quando os participantes querem ser compreendidos um pelo outro e quando há um conhecimento recíproco sobre o que está sendo dito. No entanto, van Dijk lembra que o que vale é a interpretação que os participantes dão ao contexto. O autor também nos ensina que a conversação quotidiana e a fala na interação própria dos ambientes institucionais são caracterizadas fundamentalmente pela presença de vários participantes e das relações entre eles e que essas devem ser  analisadas dentro  do evento comunicativo e que deve se levar em consideração os numeroso atos sociais, assim  como as normas e regras que os membros usam para conduzir a conversa. 
            Ainda segundo o autor, a idade, as relações hierárquico-sociais definem os vários tipos de turno nos atos da fala, sendo que essas relações mudam de acordo com  a cultura do país onde são observadas, garantindo a hora e a vez de cada participante se manifestar. O autor lembra que essas relações não são estáticas e que estão mudando de acordo com as transformações das sociedades e dos costumes, principalmente no que diz respeito às mulheres que, em algumas culturas, estão adquirindo o direito de se manifestarem.
            O autor ensina faz uma explanação sobre as regras de normas da abertura, fechamento e sequenciação, seja nas conversas informais ou formais, sendo que nessas ainda vale o status social e das relações de poder entre os participantes. Nas situações formais o tempo é observado. Muitas vezes, cada falante tem um tempo pré-determinado, de acordo com sua importância. Em situações preestabelecidas como aula, visita a uma loja para compras, após a saudação inicial, os participantes conhecem as etapas da conversação.
            Para van Dijk as múltiplas maneiras como os parâmetros contextuais influenciam outros aspectos da fala são um assunto que exigiria muitos outros estudos. e que os fatores contextuais mais fortes além dos já citados são as categorias (construídas) de participantes como seus papeis, gênero social identidades culturais  e classe social bem como as relações entre os participantes. Contudo ele lembra que a fala ainda pode depender dos fatores e  interações mais complexos no contexto. O que conta, mais uma vez, é que tudo depende do contexto e de como os participantes definem esse contexto. Em seu estudo, van Dijk mostra que as recusas, os elogios e a polidez numa conversação variam de acordo com o gênero, o status social e a cultura.  Ele conclui esse capitulo lembrando que devemos dar “ao estudo social e cultural do uso da língua uma base teórica mais adequada e que toda maneira deverá ser formulada em termos da complexa interação dessas condições nas estruturas  e estratégias mediadas nos modelos de contexto”.
            Na conclusão do estudo, van Dijk ensina que o exame da variação do discurso na gramática, nos níveis do significado, os termos utilizados como sinônimos, metáforas, além das perspectivas, tempo e modalidade interferem e determinam o que os participantes querem representar em eventos comunicativos, levando em consideração, principalmente, as dimensões formais e as estruturas, ao fazer as escolhas lexicais e semânticas. Com uma extensa bibliografia apresentada, o que reforça e fundamentam seus estudos, van Dijk esclarece que o contexto deve ser observado por fazer parte de todo evento comunicativo do ser humano.
           




No meu morrer tem uma dor de árvore.

Manoel de Barros, do "Livro das Ignorãças"