Nessa
manhã, indo para o trabalho, notei no banco da frente, uma mãe e seu filho. Fiz
menção de inclinar-me para brincar com a criança. Sempre faço isso. Como
trabalho em uma creche - e gosto do que faço - todas elas me chamam a atenção. No
entanto, retraí-me logo. Percebi de
imediato o olhar vago, inconfundível, de sindrômicos. Ouvi a mãe cantando
baixinho para que o filho batesse palmas. Talvez fosse algum tipo de exercício,
pois ele não tinha os dedinhos. Desviei o olhar.
A visão, a proximidade, não me incomodava, mas
como seria a reação da mãe se percebesse o meu interesse? Normalmente, toda mãe
se inquieta diante de um desconhecido que brinca com seu filho. E deve ser
assim. Contudo nesse caso, eu era, absolutamente, solidária a ela.
Voltei-me
para dentro de mim mesma e fui atrás de lembranças nem tão antigas, nem
apagadas. Revivi emoções e sofrimentos
tão intensos que parecem ser ter sido ontem. A crueldade das reações das
pessoas diante de uma criança assim só perde para o concreto da situação. Os
problemas reais que uma mãe enfrenta para que um filho portador de alguma
síndrome sobreviva, e bem, são gigantescos. É certo que ela tenta!
Mas,
pobre da mãe que tem um filho não perfeito nesse mundo de seres (im)perfeitos!
Como sofre! Por si e por seu filho! Talvez o filho sofra menos. Concentrado na
ânsia de viver, de tentar, de conseguir a superação, talvez nem perceba o
preconceito. Qualquer avanço, para ele, será mais uma vitória.
A
mãe... sofre. Se “ser mãe”, como disse o poeta, “é sofrer no paraíso”, essa mãe
não o terá encontrado. Ela tenta se enganar com as alegrias das pequenas
vitórias, e se diz abençoada, para justificar
as lágrimas. A dor de ver o filho ultrajado talvez se compare apenas à
Daquela Mãe de todas as mães. Somente
aí, essa mãe encontra um pouco de refúgio. O espinho encravado não sairá tão
facilmente. Será preciso muita coragem.
Muitos
se compadecerão. Mas esse sentimento é, quase sempre, doído como uma bofetada. A
compaixão, muitas vezes, é inútil e dispensável. Quase sempre, uma ofensa.
Não
acredite no riso dessa mãe. Quase sempre será um embuste. Afinal é preciso ensinar ao filho que se deve
sorrir, às vezes, e caminhar em frente. É
preciso mostrar ao mundo que as mães são corajosas, são fortes e superam
qualquer obstáculo. Porém, isso é apenas uma casca. Frágil. Não pode se
comparar a uma armadura, porque, a mãe continua a receber os golpes que vão
minando sua resistência, e aos poucos a esperança de qualquer coisa se resume
ao mais elementar instinto de sobrevivência. Ainda assim ela continua, porque é
preciso continuar. E porque Deus considerou que ela fosse capaz de cuidar de um
filho Seu. Embora se pergunte sempre “Por que eu?”, resigna-se. Somente Ele lhe dará forças.
Lécia Conceição de Freitas
Nenhum comentário:
Postar um comentário