segunda-feira, 19 de setembro de 2016

NÃO ME ACHO



            O amor, não posso  dizer que veio sem avisar. Eu o busquei incessantemente. Eu o queria para o que desse e viesse. Até que ele apareceu, assim do nada. Apresentou-se e foi ficando. Tomou lugar dentro de mim, ocupou os espaços, os mais sagrados. Eu deixei que ele crescesse em mim como uma ideia. Seu nome, como mel lambente, grudou na minha língua, adocicando meus dias. E seu corpo se encaixou no meu. E porque foi crescendo, avolumando-se, escorre em mim. E não há o que fazer. Não sou mais eu. Se antes me achava em dois, agora, sem seu amor, já não me acho.
            Tudo que eu queria era tocar sua alma. E respirar o mesmo ar que ele. Ansiava aquelas mãos e minha vontade era tão latente que eu as imaginava, fortes, poderosas. Às vezes, eu pedia, e então ele me enviava imagens das mãos.
            Eu queria passar meus dedos, de leve, naquele rosto amado e beijar de meigo aqueles olhos. Fitava continuamente os seus olhos, que eu amava, buscando-me neles. Deixei meu corpo querer o dele. Os nossos cheiros combinavam como se se reconhecessem. Mesmo longe eu me lembrava de cada pedaço dele, das feições, de tudo. A minha vontade sempre era de sentir a barba na minha nuca, suçando. E no alto do meu querer eu desejava cada vez mais: ele nos meus braços.
            Como é que pode?! A cada dia gostava dele mais e mais! Como coisa feita! Como quebranto que não tem recurso e que nem eu mesma entendia. Tudo que queria era ficar ali, perto dele. Eu bebia a vida nos olhos dele. Eu imaginava respirar o ar que saía da boca dele. A vontade que eu tinha, mais das vezes, era ficar tão próximo dele para sentir o cheiro do suor. O cheiro dele que eu já adivinhava, tão grande era o meu querer.
            Tentava me enganar e dizia que era tudo loucura, passageiro. E me agarrava nessa ideia para não afundar. Como quando se está no fundo de um poço e se agarra às raízes. Eu pensava que poderia esquecer quando quisesse, que tudo era uma grande brincadeira. Mas, no fundo, lá naquele fundo, eu sabia que  gostava dele. De um jeito que não tinha salvação. E o que doía era saber que esse  amor  não vingaria. Não tinha como. Isso eu falava pro meu coração, eu repetia nas minhas tardes tediosas, nas minhas madrugadas insones. Falava para todas as coisas que me rodeavam, tentando tirar a imagem dele do meu pensamento. Porque todas as coisas que me rodeiam trazem no rótulo o nome dele. Tentava não pensar que gostava, mas no fundo já sabia que gostava para sempre. Isso se deu por causa do olhar dele que me puxava, me atraía, feito redemunho, feito cobra e passarinho.
            Se ele me amava? Sim ele me amava, posso dizer que me amava. Alguma coisa empurrava nós dois. Eu percebia o carinho em tudo que fazia por mim. Nas mensagens mais carinhosas que me enviava. As músicas, os vídeos. E a preocupação com meu bem estar, com minha saúde, se tinha dormido bem. Tudo ele perguntava, queria saber de tudo, da minha vida, de como tinha sido o meu dia. Eu  sentia isso nos olhos, no jeito que  me olhava. Na suas mãos, como me segurava – eu, um tesouro querido. Eu percebia a saudade dele, por minha pessoa, e o sorriso que dava, até com os olhos ele sorria, o corpo todo sorria! O meu também! E o que me dizia, as palavras. Palavra tem muita força. E as dele traziam a força do amor, que já era lei. E ele me dizia: minha querida!
            Quando penso nele a saudade vem tão grande como esse mundo. E eu sinto o meu pensamento passeando. Nele, sentindo todas as partes. É um sofrimento doído, sem tamanho, que traz em si todas as dores. Todos os sentimentos que já senti. Não há como viver sem estar grudada nele, nesse pensamento, nesse sentir. Mas a dor da saudade que me acompanha é um se acabar  em vida.
            Um amor tão grande assim... Mas a vida dispõe fatos  que não podemos ignorar, outras pessoas, outras verdades. Outras situações. E a cada encontro era uma dor sem volta. Até aquele dia.
            E eu sabia que era uma despedida, que ele não voltaria. Então eu o beijei. Beijei seus olhos, sua face, sua boca. Eu o beijei me doendo porque sabia seria a última lembrança dele. E me afastei devagar como se meus pés tivessem mil espinhos e me impedissem de andar. Na alma, a morte, que irá me acompanhar para todo o sempre.
            Às vezes, ele aparece, e me fala do desespero, da saudade, do amor que ainda sente. Eu não sei se fico alegre  ou triste. Somos os dois infelizes e tristes, terrivelmente tristes. Eu vejo que ele xinga palavrão lá na língua dele. Ele também não se conforma.
            Quando meu peito está apertado eu tenho vontade de gritar o nome dele. Pro mundo inteiro ouvir. Porque o nome dele permanece em mim – meu amor! E o pensamento nele está sempre escorrendo, feito água da fonte, que não cessa. Feito a alegria dos matos, quando a chuva cai. E feito essa tristeza que me escorre cara a fora. Meu amor só para mim. Tudo que eu queria. Com o meu pensamento eu abraço o corpo dele, - não é de verdade - mas eu sinto até os ossos, cada parte. O seu cheiro chega até meu coração. Isso me dá um prazer, me transforma, mas é doído de dar dó. Nessa hora, que penso nele, se morrer, não me importava.

                                                                                                            Lécia Freitas



                                                            Das flores que me enviava

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