sábado, 28 de julho de 2012

A menina e sua mãe



       Naquela manhã, a mãe parecia mais preocupada. A menina aprendera a identificar os sinais. A mãe, calada, passava a mão, seguidamente, na nuca e depois na testa. Como se quisesse tirar dali alguma ideia, uma solução... Além disso, a menina sabia que não tinham nada para acabar com aquela fome que lhe roía por dentro, já àquela hora da manhã. Como ela gostaria de poder ajudar, resolver todos os problemas da mãe... Se pudesse tirar das páginas da revista todas aquelas comidas gostosas, para ela e os irmãos... Talvez sua mãe sorrisse... Ficava tão bonita quando sorria!...
        Ela ouve a voz do irmão mais velho:
        - Mãe, tô com fome...
       A mãe não responde, não tem o que responder.  A menina sente raiva do irmão. Será que ele não percebe o desespero, a angústia da mãe?  Ela permanece ali no canto brincando com o irmãozinho, enquanto observa a mãe.
       De repente, a mãe se aproxima, pega o filho menor enganchando-o no quadril e diz aos outros dois:
       - Vocês peguem os dois paus do varal e venham atrás de mim. A mãe sai, rapidamente, com os dois filhos atrás tentando acompanhar seus passos. Depois de algum tempo eles param e a mãe entrega o menor à filha, dizendo-lhe:
       - Você fique aqui tomando conta do seu irmão.
       - O  que a senhora vai fazer?
       - Ali tem um pé de abóbora. Vou ver se acho alguma. Menino, pegue o pau para me ajudar, diz ela dirigindo-se ao filho mais velho.
       - Eu não quero ajudar, tô com medo de cobra. Olha o tamanho do capim...
       - Se não ajudar não come. A menina ouve aquilo e pergunta:
       - Mãe, eu tô ajudando, posso comer a parte dele?
       - Olha lá mãe, ela tá me insultando...diz o filho mais velho, quase chorando.
      -Todo mundo vai comer. Mas tem que ajudar, diz a mãe, apaziguadora, enquanto vai cutucando o capim meloso para afugentar alguma cobra ou outro animal que pudesse molestar a ela ou ao filho.
       - Achei, grita a mãe, mostrando aos filhos uma abóbora verdinha!
     A filha olha, primeiro, o rosto da mãe. A mãe está sorrindo! Vê seu rosto iluminar-se de felicidade e, então, a menina sente vontade de abraçar aquela abóbora! Junto a esse sentimento vem a alegria por saber que logo vão comer coisa. Aproxima-se da mãe e diz:
       - Ô mãe, essa abóbora com arroz vai ficar uma delícia, não vai, mãe?
      - A gente come a abóbora hoje. Outro dia, a gente come o arroz, responde a mãe, enquanto voltam apressadamente. No caminho encontram o avô que está indo para o sítio onde trabalha.
       - Onde ocês tava, pergunta o avô?
      - Nós fomos procurar uma abóbora, no pé que eu tinha visto, outro dia. Olha ela aqui, responde a mãe, mostrando a abóbora.
       - Ô minha filha, isso não é abóbora, é uma cabaça, diz o avô.
       - Não fala isso não, pai, nós não temos nada para comer. Oh, meu Deus, desespera-se a mãe!
          Nesse momento , a menina sente tudo de uma vez, como se estivesse em um redemoinho. E agora, como vão fazer? Percebe a decepção, o sofrimento da mãe. Queria inverter os papéis, pegá-la no colo, acalmá-la... Como num sonho ouve a voz do avô...
     - Espia aqui, filha. Tô levando o farelo "pros" pintinhos do patrão. Você pega um pouco, coa e apura o fubá. Daí faz um fubá suado. Vai dar para matar a fome.
A menina ouve aquilo num misto de alegria e tristeza. No seu coração ela jura pra si mesma:
      - Um dia eu vou crescer, vou trabalhar, e então nunca mais vamos sentir fome.

 Pará de Minas, 26 de maio de 2010

Lécia Conceição de Freitas

Nenhum comentário:

Postar um comentário