sábado, 7 de maio de 2016

Sobre um amor

Enquanto houver poesia

Estes tempos modernos, de muita velocidade, não sei se fazem bem para o amor. Decide-se as coisas muito rapidamente.  Tão logo se conhece uma pessoa já se sabe tudo dela pelas redes sociais. Mesmo o mais simples dos mortais, fica fácil descobrir sobre sua vida. Mesmo se for tudo falseado, descobre-se. E assim perde-se muito da poesia. No meu tempo de mocidade, demorava um tempão para o rapaz criar coragem de nos dirigir a palavra. Era tudo muito ensaiado, ainda  assim a gente morria de vergonha. Os sentimentos ficavam camuflados.
Naquele tempo, moça direita, de família, não sabia o que era tesão. Essas coisas, e a palavra, descobri já madura. Meu marido me disse certa vez, que quando nos casamos, eu não sabia nem beijar. Questões relacionadas a sexo eram proibidas em conversas de moças casadoiras. Tudo era muito reprimido.
Eu penso, porém, que havia mais poesia. Pelo menos, quando a gente conhecia uma pessoa e se interessava, tinha um tempo para ficar sonhando. Qualquer atitude, qualquer acontecimento demorava para se tornar público. E assim, podíamos ficar divagando...Se o romance ia dar certo é outra história.
Hoje, com essa velocidade reinante, conhece-se uma pessoa, mas não convém criar sonhos, ilusões. De um minuto para outro, já se sabe, se vai "rolar". Basta enviar uma mensagem. Se a pessoa visualizar e não responder, esqueça. Não vai dar. Você pode arrancar os cabelos de decepção, mas o outro não está nem aí para você. Além de ser uma falta de educação, fica explícito que ele não quer conversa. E assim, não deu nem tempo para se instalar a poesia. Que me perdoem os insensíveis, mas há que haver poesia. Mesmo em gemidos e sussurros há que haver poesia, repito.
E aí a pessoa “lota” a caixa de mensagem. Manda frases de amor, figurinhas românticas e esdrúxulas, vídeos, áudios e nada, Continua no vácuo.
Uma coisa temos que reconhecer: a dor é a mesma! Tanto nos tempos de outrora, repressivos, das trevas, tanto nos tempos cibernéticos.
Não existe dor maior que a da rejeição, seja física ou psicológica, emocional. Como disse o autor “A dor de amor dói de se dar guinchos”. A pessoa não amada vê tudo que cuidou com carinho -o sentimento- ser desprezado. Aquele amor que ela acreditava ser precioso e desejado, ela vê ser jogado no lixo. O outro, o ser amado, nem percebe o sofrimento alheio. Pelo contrário, chateia-se com tudo aquilo e quer se ver livre logo. Não adianta os amigos, solidários, darem conselhos, levar para balada, passeios. A atenção, o carinho são válidos, porém, o que a pessoa quer é que o amado perceba o tamanho do amor, pelo tanto do sofrimento. E aí, dá-lhe músicas melosas. Nessa hora, não tem Pink Floyd, Led Zepellin que dê jeito. Desenterra-se todos os Detalhes e Cavalgadas do Roberto.
O que se tem a fazer, então, é morrer de tanto chorar. Morrer de tanto ter pena de si mesma, até a dor passar. Até o amor acabar, esgotar.
Com o tempo quem sabe, acreditar novamente no amor e esperar alguém... E se depois de tudo não restar pedra sobre pedra, medrará  a poesia.

Lécia Conceição de Freitas


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