Por
vezes acreditamos, que diante de determinados sofrimentos ou acontecimentos não
suportaríamos a dor e com certeza sucumbiríamos. Isso, às vezes, até acontece
com algumas pessoas, mas são casos que requerem uma observação mais profunda. Em
diversas situações do dia a dia em que somos devastados por acontecimentos e
que pensamos em desistir, com o passar do tempo, ainda que devagar, vamos
retornando à vida. Isso porque, geralmente somos atingindos apenas em uma parte
do nosso ser. As outras permanecem intactas, e são elas que nos servem de
esteio nesses momentos.
Trazemos
em nós as marcas que buscamos ao longo da vida, aquelas que nos fizemos por
gostarmos de algo, nossas preferências, nossas escolhas, e nossos bem quereres.
Mas trazemos marcas que outros nos trouxeram, que imprimiram em nossa vida. São
as marcas dos amigos queridos, dos familiares, colegas de trabalho, enfim
pessoas com as quais convivemos e que às vezes, nos trazem um alento meio à
tormenta. Essas marcas são os sentimentos que deixamos aflorar, e que nos define como humanos, e que nos transporta para o mundo do outro, mesmo que não percebamos,
porque é tão corriqueiro, tão cotidiano, mas é o que nos mantém de pé.
Somos
ensinados ao longo da vida que somos um só, com todas as nossas
particularidades. Mas não é bem assim. Somos muitos, múltiplos, e estamos
sempre acrescentando, renovando, transformando partes de nós em nós mesmos.
Quando somos atingidos em um sentimento, lançamos mão de outros para suportar
decepções, frustações, etc. E tem que ser assim, senão o mundo seria mesmo um
vale de lágrimas. Porque todos temos problemas e sofremos em algum momento ou
em vários.
É
certo que temos amigos, familiares, dispostos a socorrer em momentos de
angústia, de baixa autoestima, porém nem sempre podemos recorrer a eles. Todos
têm suas ocupações, e tudo é tão longe, e nem sempre queremos falar sobre
aquilo. Muitas vezes, a dor que sentimos pede silêncio, pede solidão.É como
aquele espinho que fincou tão fundo, que é melhor não mexer, por enquanto. Espera-se,
com o tempo, que o próprio organismo o rejeite. Como um corpo estranho. Nesses
casos, aos amigos, resta respeitar a atitude, o pedido mudo de compreensão, da necessidade
de recolhimento.
Existem
almas que só se encontram ante a si mesmas por maior que seja a oferta de
ajuda, precisam ficar sós, mudas. Existem almas que por sua delicadeza recebem
os golpes muito mais profundamente. Ferem-se diante da crueza
dos fatos de tal forma, que é preciso um ato de cada vez a lhe juntar os
pedaços, minuciosamente, uma parte de cada vez, para que não se lhe falte nada.
E depois é preciso, com cuidado embalsamar tudo aquilo com muita serenidade
para consolidar cicatrizes, que essas, sim, ficarão para toda vida.
Felizmente, almas, principalmente aquelas que já foram felizes e que anseiam pela vida, são pródigas. Aos
poucos retornam e aí então, somente aí, elas vão buscar o abraço amigo, a
palavra, o riso. E a vida recomeça, com nossas crenças, nossos acertos, nossas
esperanças.
E marcas.
Lécia Freitas
Um dia, alguém me deu estas flores! Foi a maior marca que poderia me acontecer. Mudou minha vida!