sexta-feira, 3 de agosto de 2018

As pessoas que amamos um dia nunca morrem, de fato. Vez ou outra, seja um cheiro, seja um som, que nos traz o vento, ou mesmo uma solidão ocasional, lembramos. Coração da gente é campo fértil, ou água parada.Basta uma coisica de nada, basta tocar na superfície e tudo se movimenta, vem à tona. Nessas horas, não se deve ir de roldão às imagens que se atropelam na retina. Nem às palavras que se musicalizaram apenas para nós, transformando passos em dança. Lembre, sim daquele canteiro de flores amarelas que foram sendo arrancadas uma a uma. Lembre do olhar seco feito areal que lhe negou o carinho primeiro. Pense que enquanto delineava a própria alma com as emoções mais verdadeiras e que pudesse partilhar, o sentimento era teorizado, contextualizado com uma realidade que não lhe fazia parte. Apenas feria. Aceite, ainda que doa,que todo sentimento é par. É fundamental o outro. Não existe amor sozinho. Então, se não existe o outro, não há como existir nenhum sentimento. E não há como existir saudade. O que a gente sente é tristeza pelo que foi sem nunca ter sido. Da frustação por algo que não deu certo. Acabou no meio do caminho. Como um cantil com água fresca que se carrega meio ao deserto, e que significa a própria sobrevivência, mas por um descuido, ou por excesso, acaba-se a água. E é preciso continuar o caminho, às vezes desvia-se um pouco para encontrar nova fonte, e seguir. Porque a vida é dádiva e não se deve desistir, ainda que se caminhe sozinho. Nesse caso, a lembrança da cantiga da água escorrendo entre as pedras pode ser uma tortura. Mas será sempre um motivador. Faça da saudade indesejada, não motivo de sofrimento, mas a certeza da capacidade de sentir. Isso é fazer parte da vida.

Lecia Freitas



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