Existem sentimentos dentro de nós que realmente não se deixam apagar. Não nos abandonam a despeito de nossa vontade. Podem perder a força, transformar, mudar de nome, mas não vão embora, nem acabam de vez. Como uma cicatriz que atesta um sofrimento, fica ali. O sujeito camufla, esconde, deixa a pele que se renova ir tomando conta, no entanto, bastam as circunstâncias que ele aparece. Tem consciência do poder, da força e por isso, trava o embate silencioso. Imagina que pode ser mais forte e então aprisiona, esconde, amordaça todas as vozes, faz tudo que se deve fazer. Entretanto, volta e meia, como a ponta de um espinho, desses do matinho na beira da horta, ele finca. Bastam cheiros, sons, alguma tarde mais outonada, e eles vêm. Porque era forte, era verdadeiro. E tudo que queria era existir. Você permitiu, alimentou, cuidou com carinho. Alguém disse que nada se perde. Então! O sujeito terá outros sentimentos! Tão forte quanto! Será feliz de outras formas, viverá por outro. Não mais irá chorar por aquilo, não perderá nenhuma hora, nem deixará de viver nenhuma situação por ele. Cantará outras músicas para o novo amor. Nas tardes de sábado, enfeitará a casa com paninhos de renda e outros cheiros. Cuidará de pudins com outra doçura , biscoitos de polvilho, e no domingo (tão bom), quiabo com angu. Tudo para agradar o novo amor. Contudo, aquele permanecerá ali na ruga da pele, na quina do sorriso, na dobra do lençol, no canto da casa, no recôndito do coração, de tudo.