terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Análise do Discurso --- 3



Procedimentos de Análise

O método Harris torna como unidade de análise o próprio enunciado. Esse método se baseia na linearidade do  discurso e propõe que se observe a ligação entre os enunciados a partir de conectivos, objetivando equacionar essa linearidade em classes de equivalência.
Dubois se vale desse método como uma forma  de evidenciar o que havia de regular, de constante em cada um dos discursos contrastados. Para Pêcheux, a deslinearização decorrente das transformações permitia perceber os traços dos processos discursivos, ou seja,  os processos pelos quais um discurso se constituía como tal.
Harris restringe-se a uma concepção de discurso como uma sequência de enunciados, sendo essa definição insuficiente para os propósitos  da AD que buscava reintegrar uma teoria do sujeito e uma teoria da situação. Assim Pêcheux passa a considerar a oposição enunciação e enunciado. A primeira se refere às condições de produção do discurso e o segundo se refere à superfície discursiva resultante dessas condições. Já Chomsky postula a existência de um sistema de regras internalizadas responsável pela geração das sentenças. A possibilidade de produzir uma análise nesses moldes aponta um caminho para a Ad reintegrar as teorias do sujeito e da situação. Se o sistema de regras é responsável pela geração de discursos. Para a AD a enunciação não é desvio, mas um processo constitutivo da matéria anunciada.
Este último procedimento de análise, produtivo para a Ad, formular e reformular seus procedimentos de análise e seu objeto de estudo que definirão o que chamamos as fases da AD.

Fases da AD: Os Procedimentos da Análise e a Definição do Objeto

A primeira época da análise do discurso explora a análise de discursos mais “estabilizada”, pouco polêmicas. Os discursos políticos teórico-doutrinários são  um bom exemplo por gerarem discursos através de uma produção mais estável e homogênea. Um debate entre comunistas e liberais não geraria um discurso passível de estudo na AD1 por serem  instáveis.....
Para se analisar a AD1 primeiro selecionamos um corpus fechado  sequências discursivas, em seguida faz-se a análise linguística de cada sequência , considerando as construções sintáticas e o léxico, passa-se depois à análise discursiva que consiste basicamente em construir sítios de identidades a partir da percepção da relação de sinonímia e de paráfrase, por fim  procura-se mostrar que tais relações de sinonímia e paráfrase são decorrentes de uma mesma estrutura geradora do processo discursivo.
Têm-se então a noção de “máquina discursiva”: uma estrutura responsável pela geração de um processo discursivo a partir do que compõe e dá forma a um discurso. Para a AD1 cada processo discursivo é gerado por uma máquina discursiva. O conceito de formação discursiva é o dispositivo que desencadeia esse processo de transformação na concepção do objeto de análise da Análise do Discurso.
Para Foucault a definição de formação discursiva é um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço que definiram em uma época dada, e para uma área social, econômica, geográfica, ou linguística dada, as condições de exercício da função enunciativa. Assim uma FD não pode mais ser concebida como um espaço estrutural  fechado. O espaço de uma FD é atravessado pelos discursos que vieram de outro lugar e é constituída por uma sistema de paráfrases.
O papel do analista do discurso seria descrever essa dispersão buscando estabelecer as regras de formação de cada FD. Nessa segunda fase da AD, o objeto de análise passará a ser as relações entre as “máquinas discursivas”. Na AD-3 será uma relação interdiscursiva, portanto que estruturará a identidade das FDs em questão. O procedimento de análise por etapas, com ordem fixa, como afirma Pêcheux (1983) explode definitivamente.
As recentes pesquisas afirmam o primado do interdiscurso, diferentemente da AD1, que concebe a relação entre os discursos como sendo uma relação entre máquinas discursivas justapostas, cada uma delas autônomas e fechadas sobre si mesma; e diferentemente também da AD2, que considera a existência  de FDs constituídas independentemente uma das outras para depois serem postas em relação.

O conceito de discurso
A Análise do Discurso considera como parte constitutiva do sentido de um texto o contexto histórico-social em que ele se insere, se ele é ignorado todo o sentido é alterado, fazendo com que estes sejam historicamente construídos.
Há textos que se constituem de discursos divergentes, cujas fronteiras se intersectam, tornando o texto heterogêneo  e não sendo possível se  referir a um dos discursos sem remeter ao outro, isso mostra que o discurso é um aparelho ideológico através do qual se dão embates entre posições diferenciadas, o texto se constitui da relação entre esses embates.
A AD chama de formação ideológica (FI) esse confronto de forças em um dado momento histórico, sendo que elas podem entreter entre si relações de aliança e dominação também. O conceito de formação discursiva (FD) é utilizado pela AD para designar o lugar onde se articulam discurso e ideologia  e sendo assim é governada por uma formação ideológica. Como a FI coloca em relação mais de uma força ideológica, uma FD sempre colocará em jogo mais de um discurso.
Como a FD é um dos componentes de uma formação ideológica específica, seus limites são instáveis por causa das lutas ideológicas, suas fronteiras se deslocam em função dos embates, que podem ser recuperados nas FDs em relação.
Bakthin faz uma crítica à concepção saussureana de língua como um  sistema monológico e apresenta a noção de dialogismo sobre a qual  se funda uma grande parte da Linguística. O dialogismo do círculo de Bakthin, no entanto, não tem como preocupação central o diálogo face a face. Authier-Revuz indica algumas formas de heterogeneidade mostrada no discurso, formas que se articulam sobre a realidade da heterogeneidade constitutiva de todo discurso. São três tipos  de heterogeneidade:
- aquela em que o locutor ou usa  de suas próprias palavras para traduzir  o discurso de um  Outro ou então recorta as palavras do Outro e as cita;
- aquela em que o locutor assinala as palavras do outro em seu discurso por meio, por exemplo, de aspas, itálico, de uma remissão a outro discurso, sem que o fio discursivo seja interrompido;
- aquela em que a presença do outro não é explicitamente mostrada na frase, mas é mostrada no espaço do implícito, do sugerido, como nos casos do discurso indireto livre, da antífrase, da ironia, da imitação, da alusão.
Formulando hipóteses  podemos perceber a presença constante do Outro na constituição  de uma formação discursiva, que podemos  perceber a realidade da heterogeneidade constitutiva do discurso. É considerada que os dois níveis de heterogeneidade mostrada, a marcada e a não-marcada, são na verdade, formas linguísticas de representação de diferentes modos de negociação do sujeito falante com a heterogeneidade constitutiva, sendo a heterogeneidade mostrada não-marcada uma forma mais arriscada de negociação porque, o jogar com a diluição, é mais dificilmente controlada pelo sujeito.
Sempre existe numa formação discursiva, a presença do Outro, e é essa presença que confere ao discurso o caráter de ser heterogêneo. A unidade de análise pertinente não é o discurso, mas um espaço de trocas entre vários discursos. Os diversos discursos que atravessam uma FD não passam de componentes, ou seja, em termos de gênese, tais discursos não se constituem  independentemente uns dos outros para serem, em seguida, postos em relação, mas se formam de maneira regulada no interior de um interdiscurso.


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