domingo, 19 de fevereiro de 2017

Que a verdade seja dita

CARTA ABERTA A UM VASSALO DO CAPITAL
(Em desagravo a Raduan Nassar)
Senhor Roberto Freire
A ausência do Excelência credite ao fato de excelente o senhor não ter absolutamente nada. O senhor é o meu reconhecimento à sua senilidade, à sua decrepitude.
Eu poderia abordar diversos aspectos da sua biografia e do seu comportamento, a começar pela contradição do senhor ter sido funcionário público de confiança dos generais, em plena Ditadura Militar, ao mesmo tempo em que membro do Partido Comunista e líder nas Ligas Camponesas, de Miguel Arraes.
Não é possível que o aparato de informações das Forças Armadas, que sabiam até das cores das nossas cuecas, em nossas gavetas, não soubessem disso.
Não é possível que, com toda a esquerda sabendo disso, não tivesse aparecido um traidor para denunciá-lo, um indiscreto ou leviano, para comentar, entregando-o, algum camarada que não tenha resistido à tortura, citado-o como camarada.
O que não tenho notícia é de algum militar justiçado por camponeses, com a recíproca não sendo verdadeira, com muitos camponeses morrendo por pedir reforma agrária.
Lembrei-me disso quando o ouvir gritar, em plena cólera: “esse histrionismo oposicionista está com os dias contados.”, frase perfeita na boca do General Médici, do Coronel Ustra, e de outros da escola onde o senhor se formou, travestido de comunista.
Os do seu partido, PPS, linha auxiliar do PSDB/Dem, simples puxadinho, se ufanam do senhor não estar nas delações da Lava Jato.
Verdade, de um depoente entre setenta e sete depoentes, o único do qual sabemos o teor do depoimento, faltando que saibamos dos outros setenta e seis, o senhor não aparece, mas os seus correligionários têm memória curta, o seu nome está no Mensalão do Dem, o que talvez o tenha credenciado a fazer parte desse governo.
Mas, apesar do espaço até aqui gasto, o que me motivou a escrever-lhe foi o episódio de ontem, na premiação do escritor Raduan Nassar.
O senhor reparou onde se deu a premiação, e com um número muito restrito de convidados?
Na varanda da casa do premiado, única maneira de homenageá-lo, já que avesso às pompas e circunstâncias, à exposição pública, aos holofotes da mídia, ao contrário dos políticos.
Depois, homem sensível, de intelecto apurado e afinado, Raduan fez da própria premiação um ato político, transformando o discurso de agradecimento pelo prêmio num manifesto, um libelo contra o golpe.
E o senhor falou depois, questionando o prêmio.
Lembro-lhe que não foi um júri de políticos que julgou a obra dele, mas de literatos brasileiros e portugueses, e ele venceu por unanimidade.
A mesma unanimidade que o governo do qual o senhor faz parte está quase alcançando, com mais de 80% de rejeição.
Logo, coerente com a linguagem neoliberal, para o qual tudo soa e tisne tom metálico, de moeda: vidas, destinos, pátria, moral e caráter, o senhor se referiu ao “prêmio pecuniário dado pelo governo brasileiro.”
Mais que uma demagogia barata, a sua afirmação foi hilária, típica das limitações dos que pensam com cifras.
Antes de comentar o valor alardeado, uma pequena biografia do laureado: Raduan escreve muito, tem publico cativo e poderia viver da sua obra e de atividades paralelas (palestras, tardes e noites de autógrafos, textos para jornais e revistas...) mas, sensível, decepcionou-se com a sociedade e o sistema, percebendo que há mais Robertos Freires que Paulos Freires e Gilbertos Freires, decidiu deixar de escrever e ir para o campo.
Comprou uma fazenda com terras degradadas, extremamente ácidas e tomadas por gramíneas invasoras, imprópria ao gado.
Fez seguidas calagens e adubações, por anos, tornando-as férteis e implantando diversas culturas, conseguindo produtividade acima da média nacional.
Poderia fazer o que é regra na agroburguesia, aplicar o próprio capital no mercado financeiro, contrair empréstimos subsidiados, entrar para a UDR e a SNA, apoiar a Bancada do Boi, mas, ao invés, aplicou na própria fazenda, reinvestindo, e nas pequenas propriedades vizinhas, de agricultores pobres, por doação.
Já com idade, fez convênio com uma universidade pública e transformaram a fazenda num campo avançado, para estudos de agronomia.
Agora, aos oitenta anos, pegou um pedaço da fazenda e deu para o seu funcionário mais antigo, o que começou com ele e permaneceu fiel, e o resto da fazenda ele doou para a universidade, com o compromisso dela formar agricultores familiares, produzir pesquisas para a agricultura familiar.
Sr. Roberto Freire, os que lhe cercam quando foram governo nunca construíram uma única universidade pública, e agora querem privatizar as que os outros construíram, acabando com a universidade pública no Brasil.
Os que Raduan defendeu construíram 18 universidades e 55 campi.
Vamos agora ao valor pecuniário que o governo deu, segundo as suas palavras.
Primeiro que governos não dão nada, são a ponte entre a fonte, o tesouro nacional, o erário público, o dinheiro do cidadão contribuinte, do povo brasileiro, e o destinatário, nem sempre chegando ao destinatário, como bem demonstra a lista da Odebrecht, onde os do governo ao qual o Sr. pertence são maioria.
Segundo que este dinheiro não foi dado por iniciativa do atual governo. Este prêmio, Camões, foi criado há muitos anos, por iniciativa do governo português, em parceria com o governo brasileiro, com 12 brasileiros já tendo vencido.
O governo apenas cumpriu compromisso previsto em contrato.
Finalmente o valor pecuniário, jogado na cara do premiado como se fosse uma fortuna: cem mil euros, menos de quatrocentos mil reais, insuficientes para comprar um dos tratores ou colheitadeiras guardadas nos galpões da fazenda de Raduan, vinte e cinco vezes menos que o seu chefe, Temer, recebeu da Odebrecht, cinquenta e oito vezes menos que o seu colega de ministério, José Serra, recebeu da Odebrecht, com a diferença de que o dinheiro recebido por Raduan é lícito, sem necessidade dele golpear a democracia para livrar-se da justiça.
Raduan discursou em nome de milhões de brasileiros, enquanto o Senhor... Sob vaias e gritos de fora Temer, falou pelo ditador.
Francisco Costa
Rio, 18/02/2017.
Na foto, Raduan e Dilma, quando, na iminência do golpe, ele saiu de sua fazenda, o que raramente faz, e foi à Brasília, para dar o seu abraço de solidariedade.

RESENHA: Aprendendo a Língua Portuguesa



Metodologia da Língua Portuguesa (195 p.  Curitiba: Ipbex.  20º ed. 2007) de Maria Lúcia de Castro Gomes apresenta em três capítulos um estudo sobre a Língua Portuguesa, a visão da autora sobre as suas peculiaridades, e a forma de ensiná-la. A autora espera que suas ideias, expostas no livro, promovam mudanças na educação e no sistema de ensino.
            No primeiro capítulo a autora, de acordo com teóricos, afirma que a fala adquirida enquanto criança é o motor real da comunicação verbal. Para Gomes a discussão teórica sobre a aquisição da fala torna-se importante para compreensão das dificuldades enfrentadas pelos alunos no momento de aprender a ler e escrever.
            Sobre a escrita a autora considera que está correlacionada com a leitura sendo que as duas práticas são complementares. Ela considera ainda que é papel da  escola formar leitores que sejam também capazes de produzir textos “coerentes, coesos, e adequados e ortograficamente escritos”.
            Para entender o processo de aquisição da escrita, a autora adentra em Linguística e na sonoridade da língua falada, devido à influência nesse processo. Ela acredita que os professores dos anos iniciais devem ter conhecimento dos aspectos fônicos da língua portuguesa que o torne capacitado a ajudar a criança na aquisição da escrita.
            No segundo capítulo, a autora aborda o tema sociolinguística mais precisamente da variação linguística, das normas, do preconceito e do conceito de erro. Gomes esclarece sobre o papel da escola no ensino da língua padrão dentro do conceito do ensino da língua para o letramento e inclusão social
            No terceiro capítulo o tema a capacidade de comunicação através das habilidades de falar, ouvir, ler e escrever. A autora trata de questões teóricas que envolvem o ensino dessas quatro habilidades.
            Finalmente, no quarto capítulo, Gomes trata da prática de cada uma dessas habilidades: o tratamento da oralidade, a prática da leitura e a produção de textos.

            Excelente livro  recomendado aos estudantes de Pedagogia e Letras, aos  professores dos anos iniciais e também  aos professores  que atuam em séries mais avançadas. É um estudo  que pode ajudar também  a quem se interessa pelos processos de aquisição e aprendizagem da língua materna.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

A Poética Roseana Capítulo 2.1


2.1 O Poeta do Sertão
      (O AUTOR)



Minha biografia, sobretudo minha biografia literária, não deveria ser crucificada em anos. As aventuras não têm tempo, não têm princípio nem fim. E meus livros são aventuras: para mim, são minha maior aventura. Escrevendo, descubro sempre um novo pedaço de infinito. Vivo no infinito; o momento não conta. Vou lhe revelar um segredo: creio já ter vivido uma vez. Nesta vida, também fui brasileiro e me chamava João Guimarães Rosa. Quando escrevo, repito o que vivi antes. E para estas duas vidas um léxico apenas não me é suficiente.
                                                       João Guimarães Rosa


            Apresentar a biografia de João Guimarães Rosa constitui um processo minucioso de pesquisa. A vida desse escritor é uma sucessão de acontecimentos que não poderiam deixar de ser citados. No entanto, é imperioso que se faça uma filtração devido à enorme quantidade de informações existentes. Para isso, selecionaram-se os dados em dois sítios eletrônicos, devidamente citados nas referências bibliográficas. A dificuldade está em escolher e alinhavar de acordo com a própria relevância e de interesse para essa pesquisa. A história desse grande escritor, médico e diplomata, contada por Elfi Küerten Fenske começa assim:
Joãozito, como era chamado pela família, nasce em 27 de junho de 1908, com sobrenome de poeta: Rosa, filho de Florduardo. Nasce no mesmo ano em que morre Machado de Assis, numa cidade chamada Cordisburgo, que quer dizer o “burgo do coração” (FENSKE, 2013).
Sobre sua origem, Guimarães Rosa declara a seu tradutor alemão, Günter Lorenz, em uma entrevista:
 nasci em Cordisburgo, uma cidadezinha não muito interessante, mas para mim, sim, de muita importância. Além disso, em Minas Gerais; sou mineiro. E isto sim é o importante, pois quando escrevo sempre me sinto transportado para esse mundo: Cordisburgo. (ROSA apud FENSKE, 2013).

            Guimarães Rosa gostava de ficar sozinho. Nesses momentos estudava Geografia e brincava colecionando insetos. Desde pequeno, lia muito. Certa vez, disse que, quando crescesse, escreveria “um pequeno tratado para meninos quietos”.
 mas tempo bom de verdade, só começou com a conquista de algum isolamento, com a segurança de poder fechar-me num quarto e trancar a porta. Deitar no chão e imaginar estórias, poemas, romances, botando todo mundo conhecido como personagem, misturando as melhores coisas vistas e ouvidas... (ROSA apud FENSKE, 2013).

            Desde que sai de seu vilarejo natal, Cordisburgo, por volta dos 10 anos de idade, para morar com os avós e assim estudar, em Belo Horizonte, Guimarães Rosa não para mais:
Guimarães Rosa ingressou na Faculdade de Medicina de Belo Horizonte (hoje Faculdade de Medicina da UFMG) com 17 anos incompletos. Em 1926, quando cursava o 2º ano, pronunciou, no anfiteatro da Faculdade, diante do ataúde de um estudante vitimado pela febre amarela, as palavras “As pessoas não morrem, ficam encantadas”, que, ouvidas na ocasião por seus colegas Alysson de Abreu e Ismael de Faria, seriam repetidas, 41 anos depois, quando de sua posse na Academia Brasileira de Letras. Graduou-se em 1930 e, escolhido orador da turma¹ – cujo paraninfo foi o Prof. Samuel Libânio (FENSKE, 2013).

             Durante o ano e meio em que clinicou na região de Itaguara, MG, Guimarães Rosa voltou suas atenções para os mais humildes. Suas ações iam além dos cuidados médicos. Isso é relatado por Luiz Otávio Savassi Rocha, pesquisador da obra de Guimarães Rosa: [...]
com raizeiros e receitadores, a ponto de se tornar grande amigo de um deles, de nome Manoel Rodrigues de Carvalho (seu Nequinha), que morava num grotão enfurnado entre morros, num lugar conhecido por Sarandi. Kardecista, seu Nequinha parece ter inspirado a criação do personagem Compadre Quelemém, espécie de oráculo sertanejo em Grande sertão: veredas. Segundo o Prof. Paulo Rónai (comunicação pessoal), Quelemém é a transcrição exata do nome próprio Kelemen, forma húngara do antropônimo Clemente (do latim clemensentis). Como se vê, o nome faz jus ao personagem: “Homem de mansa lei, coração tão branco e grosso de bom, que mesmo pessoa muito alegre ou muito triste gosta de poder conversar com ele”. (ROCHA, 2002, p.249 – 256)
                            
            O escritor foi casado com Lígia Cabral Penna e pai de duas filhas, Vilma e Agnes. Em 1938 é nomeado Cônsul Adjunto em Hamburgo e por causa disso vai morar na Europa onde conhece Aracy Moebius de Carvalho²(Ara) que será sua segunda mulher.
            No tempo em que esteve na Alemanha, aproveita para conhecer vários países europeus. Durante o período da ll Guerra Mundial, ajudou D. Aracy, então sua esposa e chefe da seção de passaportes do consulado, a proteger e salvar a vida de muitos judeus perseguidos pelo Nazismo³, fornecendo-lhes vistos de entrada para o Brasil, sem mencionar a religião do portador. Essa atitude do casal teve o reconhecimento merecido conforme informação colhida em um sitio eletrônico cuja autoria é de Elfi Küerten Fenske:
o nome do casal Guimarães Rosa foi dado a um bosque ao longo das encostas de Jerusalém, em 1985. Segundo D. Aracy, que compareceu a Israel por ocasião da homenagem, seu marido sempre se absteve de comentar o assunto já que tinha muito pudor de falar de si mesmo. Apenas dizia: "Se eu não lhes der o visto, vão acabar morrendo; e aí vou ter um peso em minha consciência." (FENSKE, 2013).

            Guimarães Rosa não gostava de dar entrevistas, segundo suas palavras a Lorenz: “Eu certamente não teria aceito seu convite se esperasse uma entrevista. As entrevistas são trocas de palavras em que um formula ao outro perguntas cujas respostas já conhece de antemão.” Das conversas e poucas entrevistas que ficaram gravadas, pode-se extrair revelações sobre o que o autor pensava e sentia.  A citação extensa justifica-se pela beleza do conteúdo e por entender-se que é uma maneira de conhecer um pouco das ideias e personalidade desse grande escritor:
– João, como é que você, que fala com essa absurda simplicidade, usa todo aquele “rebuscamento” para criar um conto?
- Você conhece os meus cadernos, não conhece? Quando eu saio montado num cavalo, por minha Minas Gerais, vou tomando nota de coisas. O caderno fica impregnado de sangue de boi, suor de cavalo, folha machucada. Cada pássaro que voa, cada espécie, tem vôo diferente. Quero descobrir o que caracteriza o vôo de cada pássaro, em cada momento. Não há nada igual neste mundo. Não quero palavra, mas coisa, movimento, vôo. - Fale de seu pai.
- Papai é um homem muito rigoroso. Quando eu era menino me levava pra caçar com ele. Quando eu avistava caça, gritava por papai. Ele vinha correndo e a caça fugia. Um dia papai desconfiou que eu gritava de propósito para que ele não pudesse matar os bichos e nunca mais me levou. Papai era comerciante, está velhinho hoje. Quando eu era garoto pensava que era rico. Lá, em Cordisburgo... eu era. Mas quando precisei ser rico ... cadê?
 - Você não acha que seria bom, para aproximar sua obra do grande público, para que o público venha conhecer melhor Guimarães Rosa gente, falar mais de você?
 - Não. Quero que a minha obra se imponha sozinha. O livro deve ser vendido como toucinho, manteiga. Nunca quis ajuda de pessoas amigas para os meus livros. Deve ser coisa impessoal. A prova da arte é vender-se por si. Eu não crio facilidade, crio dificuldade. Só acredito no eterno. Não quero facilidades. Por isso meu livro “Sagarana” começa com o conto mais difícil. Se eu pudesse só poria, nas capas, as críticas que escrevessem mal de meus livros, para dificultar ainda mais. Tenho tanta confiança de que a minha obra vai crescer com o tempo que sua divulgação não me preocupa. A conversa muda de rumo:
 - Quando vim para a cidade grande, respirei ao ver que a gente não conhece o condutor nem o vizinho. A cidade grande desumaniza... mas depois, humaniza num plano mais alto. Detesto o cotidiano. Pra mim é um suplício comer, fazer a barba, vestir. O todo-dia é um inferno. Não leio jornal na hora. Jornal é angústia concentrada. Só leio matutino à noite... pra dar distância. Vivo para uma coisa maior, um vir-a-ser de uma natureza diferente. A arte permite isso. Permite essa transformação. Por mim os livros não deviam nem trazer nome do autor. O autor devia ser um mistério. - Estamos quase chegando e eu pergunto cretinamente: - Por que você só usa gravata borboleta?
 - Não é pergunta de entrevista, é?
 - Não. É que eu acho que a gravata borboleta define as pessoas.
 - É porque nunca aprendi a dar laço nas gravatas comuns. Acho esta mais fácil.
 Paro o carro, enquanto Rosa termina um pensamento de algo discutido antes:
- Vejo o ser humano como rascunho do que vai ser.
 Ele salta e se despede:
- Desculpe, Bloch. Não fique decepcionado comigo, mas eu não dou entrevista. Você compreende, não é? Não posso magoar os outros.
E fecha a porta do carro, enquanto lhe grito:  - E o Brasil, hem?
 - O Brasil, como?
 - Você não está sofrendo com as surras que estamos levando na Europa em futebol?
 - Eu não leio as derrotas do Brasil. ("Você sabe que eu fui center-half no time do meu colégio?") E ao se afastar: - Só leio jornal quando o Brasil ganha.[5]  

             Guimarães Rosa sonhava em entrar para a Academia Brasileira de Letras. Dizia que precisava provar para sua mãe que era um escritor de verdade e porque não podia negar a glória acadêmica à sua pequena cidade, Cordisburgo. Tentou por duas vezes, até que consegui. Em seu sitio eletrônico, Arnaldo Nogueira Junior informa que:
em 1963 candidata-se, pela segunda vez, à Academia Brasileira de Letras, na vaga de João Neves da Fontoura, e visita acadêmicos, em campanha eleitoral, firmemente decidido a obter vitória. É eleito, em 08 de agosto, por unanimidade, membro da Academia Brasileira de Letras. Misteriosamente, começa a adiar, sine die, a cerimônia de posse. Após quatro anos de adiamento, reflexo do medo que sentia da emoção que o momento lhe causaria, resolve assumir a cadeira na ABL.” – A Academia é muito para mim. Sou tão pequeno como a cidade em que nasci”- Ainda que risse do pressentimento, afirmou no discurso de posse: "...a gente morre é para provar que viveu." O escritor pronuncia seu discurso de posse por 1 hora e meia com a voz embargada. Parece pressentir que algo de mal lhe aconteceria. Com efeito, três dias depois, em 19 de novembro de 1967, ele morreria subitamente em seu apartamento em Copacabana, sozinho (a esposa fora à missa), mal tendo tempo de chamar por socorro (NOGUEIRA JUNIOR, 2013).

             Embora tenha começado a publicar aos 38 anos, com uma bibliografia considerada pequena, Guimarães Rosa conseguiu com sua arte em palavrear, um lugar de destaque na Literatura Brasileira. Esse grande escritor, possuidor de qualidades ímpares como ser humano, distinguiu os seus conterrâneos e reverenciou a Língua Portuguesa. Alcançou o mundo...




[1] O discurso do doutorando João Guimarães Rosa – Sob o foco das lanternas evocadoras – foi publicado no “Jornal Minas Geraes”, órgão da Imprensa Oficial do Estado, em sua edição de 22 e 23 de dezembro de 1930. (ROCHA, Luiz Otávio Savassi. SCRIPTA, Belo Horizonte, v. 5, n. 10, p. 249- 256, 1º sem. 2002).

[2] Aracy Carvalho Guimarães Rosa recebeu do marido uma das homenagens que merecia. É dedicado a ela um dos livros fundamentais da moderna literatura brasileira: "Grande Sertão: Veredas"."A Aracy, minha mulher, Ara, pertence este livro”.
[3] Sobre esse assunto Guimarães Rosa responde a LORENZ: “E agora o que houve em Hamburgo é preciso acrescentar mais alguma coisa. Eu, o homem do sertão, não posso presenciar injustiças. No sertão, num caso desses imediatamente a gente saca o revólver, e lá isso não era possível. Precisamente por isso idealizei um estratagema diplomático, e não foi assim tão perigoso. E agora me ocupo de problemas de limites de fronteiras e por isso vivo muito mais limitado.”
[4] Em 08 de julho 1982, recebe o título de "Justa entre as Nações", concedido pelo Museu do Holocausto de Jerusalém, por salvar a vida de vários judeus, vítimas do nazismo. É considerada o Anjo de Hamburgo, prêmio da ONG B’nai B’rith (instituição judaica). Apenas outro brasileiro, o embaixador Luiz de Souza Dantas (1876-1954), recebeu a mesma honraria, em 2003. A única mulher mencionada no Museu do Holocausto, em Israel e nos Estados Unidos, é importante ressaltar sua existência e exaltá-la na história do Brasil na II Guerra Mundial.(FENSKE, 2011).

[5] Guimarães Rosa, entrevistado por Pedro Bloch e Publicado na revista Manchete, nº 580, de 15/06/1963. [Extraído de: Pedro Bloch entrevista Rio de Janeiro, Bloch, Ed. 1989].

A Poética Roseana Capítulo II

  2 Um Fosforém
     (A OBRA)

 Eu trazia sempre os ouvidos atentos, escutava todo o que podia e comecei a transformar em lenda o ambiente que me rodeava, porque este, em sua essência, era e continua sendo uma lenda.       
João Guimarães Rosa

            Em uma narrativa com cerca de 600 páginas, sem seções e sem capítulos, João Guimarães Rosa, apresenta sua obra-prima Grande Sertão: Veredas.
            Trata-se de um monólogo em que Riobaldo conta a sua vida a um senhor, da cidade, na tentativa de compreender o que viveu, no tempo em que era chefe de jagunços e apelidava-se Tatarana e depois Urutú-Branco. Esse senhor, que muitos estudiosos pressupõem ser o próprio autor, não se manifesta, sendo perceptível apenas pelas marcas textuais, o que, em uma análise, pode ser entendido como um interlocutor. Não há falas desse senhor, mas percebe-se sua presença pelas supostas perguntas e pela reiteração do nome “senhor”. Portanto, identifica-se a alteridade no próprio silêncio e nos intervalos das falas de Riobaldo. Isso caracteriza haver um diálogo, embora se ouça apenas a voz do entrevistado, como se essa fosse a hora e a vez de um sujeito subalterno pronunciar sua versão da história: “Então, o senhor me responda: o amor assim pode vir do demo? Poderá?! Pode vir de um-que-não-existe? Mas o senhor calado convenha. Peço não ter resposta.” (ROSA, 2006, p. 139)
            Riobaldo não tinha pai e, após a morte da mãe, ele vai morar com o padrinho, que o encaminha a um professor – Mestre Lucas. Dessa forma, Riobaldo aprende a ler e escrever, o que o distingue dos outros jagunços: “Gente! Feito meninos. Disso eu fiz um pensamento: que eu era muito diverso deles todos, que sim. Então, eu não era jagunço completo, estava ali no meio executando um erro.” (ROSA, 2006, p.358).
            Ainda criança, ao pagar uma promessa de cura de doença, feita pela mãe, Riobaldo vem a conhecer o Menino nas margens do de-Janeiro. Esse encontro marca a sua vida: “Mas eu olhava esse menino com um prazer de companhia, como nunca por ninguém eu não tinha sentido”. (ROSA, 2006, p. 103). De todas as impressões que o Menino deixa em Riobaldo, uma chama a atenção, e ele vai repetir por toda a história: são os olhos verdes. Ele os descreve, já no primeiro  encontro, na travessia do Rio São Francisco: “O vacilo da canoa me dava um aumentante receio. Olhei: aqueles esmerados esmartes olhos, botados verdes, de folhudas pestanas, luziam um efeito de calma, que até me repassasse” (ROSA, 2006, p.103).
             Rejeitando a ideia de que o padrinho possa ser seu pai, Riobaldo, já adulto, foge sem rumo. Em um pouso no meio de sertão, ele reencontra o Menino, de nome Reinaldo, que se tornara um jagunço. A partir daí, Riobaldo o segue entrelaçando suas vidas em um sentimento profundo, porém inaceitável para Riobaldo, homemmacho, que não compreende como isso fora acontecer. E ele vai ser jagunço sem o desejar: “O jagunço Riobaldo. Fui eu? Fui e não fui. Não fui! – porque não sou não quero ser. Deus esteja!” (ROSA, 2006, 216).
             Reinaldo, “de feições delicadas”, mas “bom de briga de faca”, torna-se o companheiro inseparável. Em um momento, ele revela a Riobaldo possuir outro nome – Diadorim – do qual gostaria de ser chamado, porém somente quando estivessem a sós.
            Em suas divagações, Riobaldo recorda que, desde aquele dia, atravessando o de-Janeiro, Reinaldo havia lhe apresentado as belezas do sertão. Assim, por toda a história, a natureza emoldura esse amor dando força à saudade que o faz lembrar como: “Que se hoje fosse. Diadorim me pôs o rasto dele para sempre em todas essas quisquilhas da natureza.”(ROSA, 2006, p.29) Essas imagens contribuem para que a linguagem utilizada pelo autor seja mais poética.
            Em uma das lutas travadas pelos jagunços, Joca Ramiro, o Chefe, que vem a ser pai de Diadorim, é morto à traição. Riobaldo, então, promete ajudar Diadorim em sua vingança de matar os culpados. Diante da dificuldade de exterminar Hermógenes, o traidor, Riobaldo acredita que ele – Hermógenes – tem um pacto com o Demônio, o que o torna quase invencível nas lutas. Isso leva Riobaldo a tentar esse pacto, com o objetivo de ficar poderoso e assim vencer o próprio Hermógenes, em um local chamado “Veredas-Mortas”, sendo essa uma das passagens mais tensas do livro:
sapateei, então me assustando de que nem gota de nada sucedia, e a hora em vão passando. Então ele não queria existir? Existisse. Viesse! Chegasse, para o desenlace desse passo... Digo, direi, de verdade: eu estava bêbado de meu. Ah, esta vida às nãoa–vezes, é terrível bonita, horrorosamente, esta vida é grande. Remordi o ar: - Lúcifer! Lúcifer...! - Aí eu bramei, desengulindo. Não. Nada. O que a noite tem é o vozeio de um ser-só. – que principia feito grilos e estalinhos, e o sapo-cachorro, tão arranhão. E que termina num queixume borbulhado tremido, de passarinho ninhante mal-acordado dum totalzinho de sono. -Lúcifer! Satanaz!... Só outro silêncio. O senhor sabe o que o silêncio é? É a gente mesmo, demais. (ROSA, 2006, p. 422).

            Uma das questões que Riobaldo levanta ao narrar a sua vida ao “Senhor” é a opinião dele sobre esse fato. Seria verdade? Ele teria, realmente, feito um pacto com o “Que-não-há”? Nas muitas análises sobre a obra, alguns estudiosos argumentam que o autor usa um recurso para desfazer essa dúvida. Ao afirmar que o lugar onde teria feito o pacto não existe com aquele nome, tendo outro bem diferente – “Veredas Altas”– o narrador demonstra que esse fato não aconteceu realmente.
            Verdade ou não, o fato é que, ao retornar ao acampamento, Riobaldo se sente mais forte e capaz, alcançando o posto de Chefe e passando a se chamar Urutú- Branco. Nessa posição, Riobaldo consegue levar o bando a atravessar o Liso do Suassurão, uma das empreitadas mais difíceis devido à dificuldade de sobrevivência nessa região do sertão, o que faz com que todos o respeitem mais ainda.
            Entremeado com todos os acontecimentos, sobressai o amor de Riobaldo e Diadorim. Guimarães Rosa fala desse amor de uma forma que leva ao enlevamento. Contudo, cúmplice da dramaticidade presente no enredo, o leitor percebe que, assim como em outros amores imortalizados, na Literatura, deve-se esperar um desfecho insólito.
            Embora não se declarassem, um percebe o amor do outro. Diadorim revela esse sentimento através do “açoite de ciúme” que tem do amigo nos seus casos com outras mulheres, principalmente de Otacília, que ama Riobaldo. Mas é no cuidado, nas falas truncadas, nos gestos abortados a meio e nos olhares verdes da cor do rio, da cor das folhas da palmeira, que Riobaldo percebe o amor de Diadorim:
sério, quieto, feito ele mesmo, só igual a ele mesmo nesta vida. Tinha notado minha ideia de fugir, tinha me rastreado, me encontrado. Não sorriu, não falou nada. Eu também não falei. O calor do dia abandava. Naqueles olhos e tanto de Diadorim, o verde mudava sempre, como a água de todos os rios em seus lugares ensombrados. Aquele verde arenoso, mas tão moço, tinha muita velhice, muita velhice, querendo me contar coisas que a ideia da gente não dá para entender – e acho que é por isso que a gente morre. De Diadorim ter vindo, e ficar esbarrado ali, esperando meu acordar e me vendo meu dormir, era engraçado, era para se dar feliz risada. Não dei. Nem pude nem quis. Apanhei foi o silêncio dum sentimento feito um decreto: - Que você em sua vida toda por diante, tem de ficar para mim, Riobaldo, pegado em mim, sempre!... – que era como se Diadorim estivesse me dizendo. (ROSA, 2006 pp. 288-289)
             Riobaldo pede para que eles saiam daquela vida. Vão viver juntos bem longe dali. Mas Diadorim recusa naquele momento, porque quer vingar a morte do pai. E então o jagunço fica, irremediavelmente, “preso” a esse amor:
pensei em Diadorim. O que eu tinha de querer era que nós dois saíssemos sobrados com vida, desses todos combates, acabasse guerra, nós dois largávamos a jagunçada, íamos embora, para os altos Gerais tão ditos, viver em grande persistência.(ROSA, 2006 p. 208).

            Finalmente o bando de jagunços se encontra com o bando de Hermógenes e tem início a luta desejada para pôr fim ao drama vivido por todos aqueles homens. No meio da rua, no meio do redemunho, Riobaldo vê de um lado Hermógenes, “desumano, dronho – nos cabelões da barba” (ROSA, 2006, p. 594). E do outro lado, Diadorim, o grande amor de sua vida com a faca na mão. E após a luta ferrenha, o desfecho que faz os olhos marejarem e a sensação de que “o trovão não acabou de rolar até o fundo, e se sabe que caiu o raio. Diadorim tinha morrido!” (ROSA, 2006, p. 596).
            E na preparação do corpo, a verdade, terrível. A sufocação que não deixa o clarear das ideias. A surpresa pior que a dor – o estarrecimento “à coice d’arma, a coronha.” O uivo que revela o desespero diante do amor que não era impossível. E a palavra, estrangulada durante tanto tempo, se cristaliza única, doridamente – “Meu amor!”
ela era. Tal que assim se desencantava, num encanto tão terrível: e levantei a mão para me benzer – mas com ela tapei foi um soluçar, e enxuguei as lágrimas maiores. Uivei. Diadorim! Diadorim era uma mulher. Diadorim era uma mulher como o sol não acende a água do rio Urucúia, como eu solucei meu desespero (ROSA, 2006 p.599).

            Antes de abandonar a chefia dos jagunços ordena que a “Enterrem separado dos outros num aliso de vereda, adonde ninguém ache, nunca se saiba”. (ROSA, 2006, p.600). Ao atingir esse ponto da narrativa, Riobaldo declara ao seu interlocutor que a história está acabada. Como se somente essa parte da sua vida tivesse realmente importância. Ele reparte seus pertences entre os amigos, e vai embora.
resoluto saí de lá, em galope doidável. Mas, antes, reparti o dinheiro, que tinha, retirei o cinturão-cartucheiras – aí ultimei o jagunço Riobaldo! Disse adeus para todos, sempremente (ROSA, 2006, p. 600).

            Riobaldo continua o relato. Agora sucintamente com um linguajar corriqueiro, prosaico. Ele revela que ficou mal de saúde, após aqueles acontecimentos, tendo sido levado por conhecidos a uma fazenda onde permanece para se restabelecer.  Recebe a visita de Otacília e, depois de algum tempo, casa-se com ela. Contudo, confessa ao senhor que o ouve que ainda hoje, pensa em Diadorim, mesmo após tantos anos:
bem-querer de minha mulher foi que me auxiliou, rezas dela, graças. Amor vem de amor. Digo. Em Diadorim penso também – mas Diadorim é minha neblina. [...] Ah! Diadorim... e tantos anos já se passaram (ROSA, 2006, p. 24- 191).


             Hoje leva vida de “range rede” (ROSA, 2006, p.10) em uma das fazendas que herdou do padrinho, seu pai. Diante da confirmação de sua ideia, pelo senhor ouvinte, conclui as respostas para o grande dilema de sua vida: ”O diabo não há! É o que eu digo, se for... Existe é o homem humano. Travessia.” (ROSA, 2006, p. 608).

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

CANTO DE AMOR



            Os textos, o mesmo  canto profundo e emocionante à natureza, relacionam-se totalmente ao falar da verdade de que somos todos um só. Todos os seres vivos deste planeta são feitos do mesmo material. Os indígenas, talvez por viverem mais próximos da natureza, conseguiam perceber claramente esta relação. Diversos filmes e documentários mostram como era o amor e o respeito  desse povo a tudo o que se referia à terra. Mesmo sem saber a questão dos componentes químicos, eles foram capazes de entender a relação existente em tudo que é vivo.  E seus gestos, e suas falas, eram carregados de pura poesia.
            O texto de Sacramento também poético e verdadeiro, fala da ignorância humana diante dessa verdade incontestável. A autora se refere ainda ao Amor a que todos pertencemos e ao qual voltamos ao findar o nosso tempo e retornarmos  para a terra. Entende-se, segundo ela, que  voltamos ao Amor, e se ao findarmos,  voltamos à terra, a terra é o próprio Amor. Então, tudo que há,  e que vem da terra, também é feito desse Amor, e há que ser respeitado, como ensina Gibran Khalil Gibran em sua belíssima obra:
Mas já que deveis matar para comer [...] fazei disso um ato de adoração [...] e que vossa mesa seja um altar. E quando matardes um animal, dizei-lhe: Pelo mesmo poder que te imola, eu também serei imolado, e eu também servirei de alimentos para outros.  Pois a lei que te entregou às minhas mãos  me entregará a mãos mais poderosas. Teu sangue e meu sangue nada são senão a seiva que nutre a árvore do céu (GIBRAN, 1976, p. 21-22).

            Essa visão poética da relação do homem com a natureza, talvez não permita que se alcance o quão urgente e vital seja  a compreensão de que ao destruir o meio ambiente, de qualquer forma, o homem está destruindo a si mesmo e todas as possibilidades de sobrevivência na Terra. Todo tipo de extração, se não for consciente e ponderada, leva ao extermínio do recurso e, na cadeia que une tudo, o elo quebrado vai favorecer a morte de toda uma espécie. Ou outras. E todas.
            Somos interdependentes, e a terra, há muito mostra sinais de que não suporta tanta destruição. A ganância leva o homem a cometer atrocidades, seja no trato com os animais, seja com as florestas.  A produção de alimentos, cada vez maior diante do aumento da população mundial, leva à necessidade  de expansão de áreas para agricultura e pecuária, o que obriga o desmatamento e ocupação humana, e isso é um desastre.
            Em razão disso é necessário a criação de políticas ambientais capazes de reverter quadros, de criar possibilidades para refazer, cuidar da nossa única casa. É vital que a humanidade perceba que todas as coisas, ligadas pelo tênue, porque perecível, fio da vida, devem ser empregadas para a continuação dessa vida, com consciência e parcimônia. E repostas.  A consumição de um procede ao aniquilamento de todos.

Lécia Freitas


OS EQUÍVOCOS DAS REDES SOCIAIS



            Ao entrarmos nas redes sociais da web, podemos afirmar que o jovem na atualidade é extremamente politizado e defensor das minorias étnico-raciais, devido ao grande número de posts, e às manifestações sejam de apreço ou de indignação diante de acontecimentos relacionados.
            Acontece, porém que não se deve considerar  que esse fenômeno acontece agora por causa de uma politização ou conscientização. O que ocorre é que devido ao alcance dos meios de comunicação, as notícias correm e se divulgam com uma rapidez alucinante e um poder de penetração que assusta ao mesmo tempo em que informa.  E muitos jovens querem mesmo é mostrar que estão por dentro das novidades, dos acontecimentos. Muitos não sabem nem do que estão falando.
        Só para exemplificar os fatos ocorridos na época da recente ditadura no Brasil, por exemplo, são merecedores de indignação por parte da população que os presenciou e que sabem das suas consequências. Entende-se que a revolta não foi maior pelo desconhecimento de muitos fatos e por ser absolutamente proibida, durante muito tempo, a revelação dos tristes acontecimentos. Acredito, porém, que a despeito de tudo, a juventude brasileira nunca foi tão politizada como naquela época.
             O que se pode dizer, sobre os jovens de hoje, que há uma desesperança devido à própria situação de intolerância existente no mundo. Há uma descrença à valores inerentes à raça humana. Isso faz com que os jovens busquem algo com que se agarrar.  A luta das minorias étnico-raciais traz em seu bojo elementos que chamam atenção dos jovens. Mas não há uma firmeza de pensamentos e ações concretas em defesa dessas minorias.   O que há na verdade é um contra senso perceptível nas redes sociais. De que adianta um discurso bonito se na prática, quando o imigrante chega e precisa de apoio, ele é visto como alguém que vai roubar as oportunidades que seriam do cidadão nativo? Pior, de que adianta esse discurso se na realidade, os nossos excluídos são massacrados?  Porque para muitos brasileiros, não somente os jovens, as oportunidades devem ser oferecidas e divididas somente entre aqueles de seu grupo social. O preconceito grassa em nossa sociedade. O recrudescimento do racismo no cotidiano comprova a afirmativa, assustando pelas consequências e pela vergonha alheia.
            Além disso, a importância que se dá a um acontecimento doloroso envolvendo qualquer indivíduo pertencente a uma minoria é factual. A dimensão que se dá ao sofrimento nas redes sociais é absurda. No entanto, ele cessa e é esquecido diante de qualquer outro acontecimento, seja doloroso ou não, seja de qualquer pessoa ou fato. A velocidade  com que as informações se equiparam à rapidez com que são esquecidas, e assim o sofrimento é banalizado, as causas e ideais são sobrepostas. Não há aprofundamento em questões que devem ser discutidas para se tentar uma solução. O que se vê comumente são manifestações de intolerância, o que acirra o ódio. Não se percebe uma politização de fato. Quando não há intolerância, há uma indiferença, atestando a preeminência da individualidade dos tempos atuais.
            A educação brasileira tem em seus Parâmetros Curriculares Nacionais orientações sobre como trabalhar o tema desde a mais tenra idade, ainda na educação infantil. O ensino superior, nos cursos de licenciatura, também reserva um espaço em disciplinas orientando e metodologias de como ensinar os futuros alunos a  reconhecer e respeitar as diferenças.  O que se espera, ainda que seja em longo prazo, é que haja resultados positivos por meio da educação.

Lécia Freitas




PLANEJAMENTO EDUCACIONAL



Lécia Freitas

            A Educação é reconhecida, atualmente como um dos pilares da sociedade. Diante disso, ela dever ser linear e  coerente com os objetivos a que se propõe, ou seja formar o cidadão de forma integral, autônoma, e capaz de transformar a própria realidade e espaço em que se insere
            Para isso, a ação educativa deve observar contextos e realidades, principalmente do educando, para que  essa ação se torne significativa e que apresente resultados.
            Segundo o site “Portal da Educação” (2013, p.1) citando Haydt:
O planejamento de um sistema educacional é feito em nível sistêmico, isto é, em nível nacional, estadual e municipal. Consiste no processo de análise e reflexão das várias facetas de um sistema educacional, para delimitar suas dificuldades e prever alternativas de solução. O planejamento de um sistema educacional reflete a política de educação adotada (HAYDT, 2006, p.95).
           
            A escola dever fazer seu planejamento, logo no início do ano, observando a parte administrativa e pedagógica. Ressalta-se que, em suas atividades, a escola deve incluir a família como parte do processo de aprendizagem do aluno. As ações devem ser amparadas pelo Projeto Político Pedagógico da escola.
            O planejamento educacional é uma reflexão organizacional que irá fundamentar toda a ação educativa. Deve-se observar a Proposta Pedagógica amparada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9.394/96.
            Para  Izabel Alcina Soares Evangelista
No planejamento escolar, o que se planeja são atividades de ensinar e aprender, determinadas por intenções educativas que envolvem objetivos, princípios, atitudes, conteúdos e comportamentos dos profissionais que desenvolvem suas ações no chão da escola. Por esta razão o planejamento escolar nunca será individual, sempre será uma prática conjunta e participativa envolvendo a todos no plano que a escola deseja elaborar.
(EVANGELISTA, 2011, p.02).
               
            Em qualquer etapa da ação educativa deve ser observada a bagagem  do aluno e o que foi efetivamente alcançado em termos de aprendizagem na etapa anterior. Os resultados devem ser analisados e a partir daí novas estratégias serão elaboradas.
             Nos anos iniciais do Fundamental, prioriza-se o letramento e  a alfabetização como partes estruturantes. A leitura e a escrita tornam-se focos essenciais  dessa etapa. “Os alunos dos anos iniciais devem alcançar um padrão avançado de leitura e também como a escrita se organiza, o que ela representa e o que significa” (ZEN, 2014, p.1).
             Compreende-se que as atividades, nesse sentido, dever ser permeadas com o lúdico para facilitar o entendimento e para chamar a atenção do aprendiz. Além da leitura e escrita, como determinantes no processo, devem ser definidas “tarefas pedagógicas que introduzam conhecimentos matemáticos e científicos de acordo com o nível da turma possibilitando o desenvolvimento do  raciocínio e do pensamento” (ZEN, 2014, p. 01).

CONCLUSÃO
            A ação de planejar, para que apresente resultados positivos, deve apresentar linearidade com o contexto sociocultural do aluno partindo de uma  lógica que atenda o desenvolvimento do aluno de acordo com suas possibilidades e aptidões.
             Ressalta-se que os anos iniciais do Fundamental são a base de toda uma estrutura do processo de ensino e aprendizagem no que tange a formação integral do indivíduo.
            Diante disso, torna-se imprescindível o planejamento de toda ação educativa para que alcance os objetivos  que a Educação detém.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

EVANGELISTA, Izabel Alcina Soares Evangelista PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: CONCEPCOES E FUNDAMENTOS. Perspectiva Amazônica – Santarém, PA – Ano I. Vol. 2, p. 54-67. 2011. Disponível em: http://www.fit.br/revista/doc/2_32.pdf. Acesso em 23 out. 2016.
PORTAL Educação. Planejamento Educacional. 2013. Disponível em:
Acesso em 23 out. 2016.

ZEN, Daniel. A importância do planejamento pedagógico nas escolas públicas. A Gazeta do Acre. 2014. Disponível em:

   

PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO





Direitos de Portadores de Necessidades Especiais

            PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO (Ponta Grossa: Ed.UEPG, 2009. 239 p. il.) de Maria Odete Vieira Tenreiro e outros professores da Universidade Estadual de Ponta Grossa PR, traz estudos referentes à psicologia para o estudante que se embrenha nessa área. Dividida em sete unidades de ensino,  eles apresentam nessa obra, os aspectos históricos da psicologia e sua relação com a educação, o desenvolvimento da aprendizagem e as perspectivas das teorias que enfatizam o objeto de estudo e das teorias que focalizam o sujeito. Apresentam conceitos e proposições pertinentes às concepções teóricas presentes nas práticas pedagógicas, ressaltando as concepções interacionista e os aspectos peculiares do desenvolvimento humano na adolescência com o propósito de refletir sobre o sujeito da educação e sua identidade como pessoa.
            Na sétima unidade, sobre A INCLUSÃO NAS ESCOLAS E O PAPEL DA PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO (pgs de 153 a 170), subdividida em três partes  em que se conceitua inclusão e um pouco da história dos movimentos da sociedade em relação às pessoas com necessidades especiais;  o desafio nas escolas para que as diferenças sejam aceitas e que essas pessoas tenham oportunidade de construírem seu conhecimento, apesar de suas limitações;  as ideias de Piaget e de Vygotsky sobre as diferenças, no que diz respeito às possibilidades de todas as pessoas, inclusive as com necessidades especiais, de serem educadas, desenvolverem-se e participarem da vida da comunidade e que reforçam as ideias positivas dos autores.
            Os autores citam Sassaki (1997) ao conceituar inclusão social como um processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas gerais, pessoas com necessidades especiais para que tenham condições de assumir seus papeis na sociedade. Os autores afirmam que ao se discutir o desenvolvimento e aprendizagem humana, é necessário entender que as pessoas com necessidades especiais se desenvolvem como qualquer outra nos aspectos, biologico, psicológico e social. Sendo assim, deve-se compreender que elas têm sentimentos, agem sobre os objetos e podem se expressar  como qualquer outro indivíduo. Existem, na atualidade documentos que asseguram a todo  cidadão o direito legítimo de desenvolver e aprender
            Esses direitos tiveram seu início em 1981 em Singapura, de acordo com Sassaki (1997), por meio de uma organização não-governamental de pessoas deficientes físicas, denominada “Disabled People’s International”que elaborou uma declaração de princípios, em que definiu a ideia de equiparação de oportunidades e proclama que todos os sistemas gerais  da vida na  sociedade  devem ser acessíveis a todos os cidadãos. Nesse sentido, devem ser eliminadas todas as barreiras que impossibilitam a plena participação das pessoas com necessidades especiais em todas as áreas. A ideia de inclusão, portanto, segundo os autores, exige que a sociedade se modifique para acolher as pessoas que nela existem, de forma adequada, possibilitando seu desenvolvimento e que crie  alternativas para que as pessoas com qualquer deficiência  possam conviver com os demais nos mesmos locais e atividades das pessoas de sua idade, e respeitada em suas limitações.
            A finalidade  da DPI  em seu Art.1, Inciso 2, é obter a justiça com a igualação das oportunidades para todos os povos com inabilidades através do desenvolvimento da sustentação de suas organizações (DPI, 1993, p. 2). Esses princípios são fundamentais para a construção de uma sociedade democrática. Relembrando que a Educação é um direito de todos, conclamado na Conferência Mundial da Educação na Tailândia em 1990, e que a educação pode contribuir para um mundo melhor em todos os aspectos e de favorecimento para o progresso pessoal e social de todos os seres humanos.
            Os autores reconhecem que a educação hoje é deficitária e que deve ser melhorada em sua qualidade e estar universalmente disponível para todos. A declaração mundial sobre educação traz ideias sobre como todas as pessoas devem ter acesso a ela. No documento elaborado durante a Conferência Mundial sobre necessidades educativas especiais em  Salamanca, com o patrocínio da UNESCO na Espanha colocou-se as bases da inclusão de todas as pessoas na sociedade,  que garante a educação de qualidade para as pessoas com necessidades especiais.
            Segundo eles, é necessário que se estabeleça políticas escolares que reconheçam e  considerem a diversidade, subsidiando a elaboração de propostas pedagógicas inclusivas e, também, que cuidem da organização e implementação de programas de formação continuada para professores e educadores, nos quais exista um espaço para a reflexão sobre a prática educativa inclusiva, para a efetivação do processo de ensino e aprendizagem dentro do contexto escolar, atendendo as necessidades e especificidades de todos os alunos.
            Os autores afirmam que a inclusão exige de toda comunidade escolar uma tomada de consciência de seu papel nesse processo exigindo  uma reorganização nas escolas, tanto com a adequação do espaço escolar às diversas especificidades de cada pessoa com necessidades especiais que deverá acolher, quanto com os currículos esolares, objetivando  assegurar que todos os alunos possam ter acesso a todas as gamas de oportunidades educacionais e sociais oferecidas pela escola. Nesses ambientes educativos ensina-se os alunos a valorizar a diferença, pela convivência com seus pares, pelo exemplo dos professores, pelo ensino ministrado nas salas de aula, pelo clima socioafetivo das relações estabelecidas em comunidade escolar, não excluindo nenhum aluno de suas classes, de seus programas, de suas aulas, das atividades e do convívio escolar mais amplo, em   contextos educacionais em que todos  têm possibilidade de aprender, frequentando uma mesma e única turma.  O deficiente é uma pessoa com direitos. A sociedade precisa mudar seus conceitos,  e essa mudança só acontecerá quando o valor de cada pessoa for reconhecido pelo grupo. Nesse sentido, a opinião dos autores contribuem de forma confiante para que haja transformações que beneficiem os portadores de necessidades especiais.
            Piaget e Vygotsky os dois autores interacionistas reconhecem os direitos de todas as pessoas para que possam desenvolver suas potencialidades e conviver em igualdade de condições na sociedade, desde que lhes seja dada essa oportunidade.    Piaget (1971, apud AJURIAGUERRA, 1987, p.135) explica que: [...] não se limita à constatação do êxito ou do fracasso em uma determinada prova, mas também possibilita analisar a atividade manifestada pelo sujeito e que está em relação com suas aquisições anteriores, com sua capacidade de integrar o novo ao já adquirido, sendo possível  obter-se um quadro que não evidencia o déficit, mas também um quadro positivo do funcionamento, de suas possibilidades de adaptação e de utilização de ajudas externas” Isto significa que, para Piaget, são as escolas que devem se adequar aos alunos inclusos, oferecendo reais oportunidades para que possam se desenvolver e viver bem e que se a classificação e destinação das pessoas a um sistema escolar específico trazem benefícios ao desenvolvimento de sua escolarização.
            Vygotsky acreditava que cabe ao grupo, desenvolver as potencialidades  das pessoas com necessidades especiais,  dentro do seu contexto social, oferecendo estímulos adequados, capazes de desenvolver suas funções psicológicas, em particular a criança com atraso mental. Vygotsky acreditava que o papel da escola é fundamental ao possibilitar o despertar dos processos internos do desenvolvimento pelo aprendizado e que é competência dos grupos socias  providenciar para que isso aconteça. Ele se preocupava com a segregação das crianças com necessidades especiais dentro de instituições e separadas do mundo real, o que realmente, é uma possibilidade. Sendo favorável  à inclusão, Vygotsky acreditava que  não importa as diferenças. Todas as pessoas podem conviver realizando trocas uma possibilitando o desenvolvimento da outra.
            O estudo favorece uma reflexão acerca do comportamento da sociedade em geral, quanto ao tratamento dispensado às pessoas com necessidades especiais, em especial aos profissionais da educação e sugere a necessidade de mudanças. Deve ser analisado pelos estudantes e também por profissionais da área, por subsidiar princípios que fundamentam umabverdadeira sociedade democrática, que garante os direitos de todo cidadão.

Lécia Freitas