segunda-feira, 17 de junho de 2019


RESENHA CRÍTICA

A REALIDADE DE CADA UM

ROCHA, Everardo P. Guimarães. O que é etnocentrismo. (1ª edição 1984) 5ª edição. São Paulo, SP. Editora Brasiliense, 1988.
Everardo P. Guimarães Rocha é  carioca nascido em um de outubro de 1951. Estudou no Colégio São Vicente de Paula e, em 1975,  formou-se em Comunicação Social na PUC do Rio de Janeiro. Concluiu o Mestrado de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro,  em 1979. Em 1982, obteve o grau de Mestre em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional da UFRJ. Sob a orientação do Prof. Dr. Roberto da Matta, escreveu a dissertação “Magia e Capitalismo: um estudo antropológico da publicidade” na qual investiga a ideologia dos anúncios publicitários e procura compará-los aos mitos, rituais e ao pensamento mágico das sociedades tribais. Na atualidade, é professor do Departamento de Comunicação Social da PUC/RJ, bolsista do CNPq e cursa o Doutorado em Antropologia Social do Museu Nacional. Tem diversos trabalhos publicados, entre os quais “Um índio Didático” na coletânea Testemunha Ocular: Textos de Antropologia Social do Cotidiano da Editora Brasiliense. Sua carreira o levou aos estudos para o roteiro do filme Quilombo de Cacá Diégues (BRASÃO, 2015, p.1).
A obra, O que é o Etnocentrismo,  escrita de forma clara, com fácil entendimento, estrutura-se em cinco capítulos bem definidos. O autor utiliza discurso direto fundamentando-se na História da Antropologia. Apoia-se em teóricos de renome como Franz Boas, Emile Durkheim, Lévi-Strauss, Radcliffe-Brown, Malinowski . Esses autores criaram as bases para um maior entendimento do conceito de etnocentrismo. Ele mostra o caminho percorrido para superar  etnocentrismo por meio do desenvolvimento da ideia de relativização cultural, tendo como tema do discurso  diferentes visões do conceito de cultura.
           
No primeiro capítulo, Pensando em partir, o autor conceitua etnocentrismo, e apresenta o embate da descoberta do “outro”. De acordo com Rocha, o etnocentrismo pode ser definido como uma visão  do mundo em que o nosso grupo é considerado como acima de todos os outros  e os outros devem ser vistos e sentidos de acordo com nossos valores,nossos modelos e a forma como definimos a nossa existência.
O autor afirma que o etnocentrismo acontece entre pessoas de culturas  diferentes que convivem e também entre pessoas de uma mesma cultura, gerando juízos de valores  de um em relação aos costumes do outro, sendo o resultado da dificuldade em aceitar as diferenças. Ele explica  a relativização,  como a dificuldade em compreender o “outro”, em sua própria visão, entendendo que essa realidade se altera de acordo com a visão de cada um e que os valores não são absolutos, não se aplicando a todos os seres humanos da mesma forma.
           
No segundo capítulo, Primeiros movimentos, Rocha trata do nascedouro da Antropologia e de como enfrentou o etnocentrismo na concepção do “outro”. O autor faz um estudo do século XVI para poder entender  o sentido da descoberta de que existiam outros povos, ou seja outras culturas. O Evolucionismo que há um processo contínuo de desenvolvimento, o que o faz superior a cada etapa vencida, Dessa forma, o outro é diferente quando está num estágio inferior da evolução. Essa forma de pensar leva à ideia de que todos caminham da mesma forma para o progresso, existindo graus de evolução cujos níveis se medem pela cultura. Ainda assim, com essa visão etnocêntrica, as diferenças do outro passaram a ser reconhecidas como um processo de evolução, deixando de ser considerado  como animal e passando a ser reconhecido humano. Restava saber como definir o nível de evolução de cada cultura. Rocha cita pensadores ao definir cultura como sendo a régua pela qual se pode classificar as culturas: selvageria, barbárie ou civilização. Essa definição é altamente etnocêntrica, uma vez que o autor inclui a própria cultua como sendo a mais evoluída. O autor  mostra que não há diferença entre a mentalidade colonialista do século XVI e a mentalidade evolucionista do século XIX. Ambas acreditam que a própria cultura é a melhor e que por isso, todas as outras devem se alinhar aos meus valores.

No terceiro capítulo, O Passaporte, Rocha cita a contribuição de Franz Boas para a Antropologia ao perceber a importância de estudar as “culturas humanas nos seus particulares”.  Boas lembra que cada grupo produzia a sua cultura a partir de suas condições históricas, climáticas e linguísticas e percebeu que era necessário estudar as sociedades  em si mesmas, com suas particularidades, afastando o Ocidente como referência. A perspectiva  de Boas leva a uma valorização da história de cada povo, o que tornou o Difuncionismo importante para a compreensão da diversidade cultural. Rocha cita o livro Casa Grande e Senzala de  Gilberto Freyre, que, segundo ele, mostra que é “possível entender a sociedade brasileira olhando os pontos microscópios de relação entre os senhores de engenho e os escravos( p.44).

No quarto capítulo, Voando alto, Rocha fala da importância de nomes como Durkheim, Malinowski, Radcliffe-Brown para a Antropologia e as Ciências Sociais na busca de uma identidade.  Ele esclarece que na hipótese evolucionista  haveria um acúmulo de progresso no homem desde o mais primitivo até o homem civilizado. No Difuncionismo há o “estudo concreto de cada cultura” e apesar da importância da história  para as duas escolas, Radcliffe-Brown discorda da vinculação da compreensão entre o presente e o passado de uma cultura, argumentando que o presente não precisa “necessariamente ser explicado pelo passado”.  Com Durkheim e os fatos sociais  descritos por ele, a sociedade passa a ser um novo ser, cujo comportamento pode ser estudado. Sendo assim, a sociedade passa a ser vista como algo mais do que a soma de indivíduos. É preciso, no entanto, ir ao encontro do “outro”, o que a Antropologia faz adquirindo novos elementos com esses novos povos que vem a conhecer.

No último capítulo, A Volta por cima,  Rocha faz um retrospecto do que foi dito e discorre sobre a Antropologia do passado e de como se vê a cultura é entendida na atualidade. Para o autor, a Antropologia procura entender a cultura das sociedades do pondo de vista do “eu” e do “outro”. Ele enseja que a Antropologia poderia ser considerada como um local onde as sociedades poderiam buscar formas de organização, um sistema de comunicação entre si e que pudesse alcançar um sentido para a vida humana. Ele ainda diz que o antropólogo busca a lógica para entender a realidade, porque cada povo tem seu próprio estilo de vida. Dessa  maneira, o antropólogo pode  se libertar das concepções da sociedade do “eu”.

Diante da realidade do nosso mundo, hoje, a ideia da globalização em que as decisões são tomadas sem considerar a identidade dos diversos povos que o habitam; onde a violência, o desrespeito e o preconceito com os diferentes têm sido banalizados, as discussões sobre a relativização e o etnocentrismo devem ser prioritárias e abrangentes.
           
Excelente livro, esclarece o fenômeno etnocêntrico e aponta formas de dominá-lo, uma vez que é um mal a ser combatido, devendo ser isso um exercício diário e individual, para se chegar ao coletivo. Somente a percepção do outro, em sua singularidade, nos fará entender a dimensão do todo, do qual fazemos parte por natureza e direito.
Deve ser lido pelos amantes da Antropologia e de outras áreas afins, pelos profissionais e acadêmicos e sociedade em geral, para se obter a compreensão do que seja a realidade de cada um.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BRASÃO, Heber Junio Pereira Brasão. RESENHA. Getec, v.5, n.9, p.61-63/2015.
Disponível em:

Acesso  23 abr. 2019.

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